Luíza Antunes - Ok…Cut! Ouvi essa frase no mínimo umas 100 vezes em dois
dias. Em geral ela vinha seguida de “let’s do it again”. Fazer parte de
um filme é exatamente tudo o que você imagina, exceto o glamour.
Significa ficar horas em pé e repetindo a mesma coisa várias vezes até o
diretor ficar satisfeito. Imagine fazer isso sem entender uma palavra
sobre o que está sendo falado na cena? Bem vindo à Bollywood.
Bollywood é a maior indústria de cinema do mundo:
1300 filmes são gravados anualmente, em comparação com 500 produções
Hollywoodianas (dados da Unesco,
descobertos pelo Rafa).
Logicamente, isso deixa todo mundo curioso. Então, quando um colega
intercambista ligou e falou que estavam recrutando estrangeiros para
trabalharem como figurantes em uma produção local, claro que a gente
topou na hora.
Marcaram de nos encontrarmos numa boate de manhã – a
cena gravada seria com os protagonistas do filme que se divertiam em uma
boate no Canadá. Os figurantes eram uns nove estrangeiros, a maioria
brasileiros, todos intercambistas. Enquanto esperávamos em uma van, nos
pediram para que a gente se arrumar como se estivéssemos saindo a noite.
Pouco tempo depois um homem, que até hoje não sei se era produtor,
diretor ou sei lá o que, chamou a mim, uma garota e um cara para
acompanhá-lo. Foi assim que eu conheci meu primeiro camarim dentro de um
trailler. Nós fomos escolhidos para ser os bartenders da boate onde seria gravada a cena.
Até figurino eu tinha: tudo bem que ele só era
arrumadinho da cintura para cima. Porque eu continuei usando minha calça
jeans por baixo no primeiro dia. Duas das produtoras improvisaram um
penteado e um maquiador fez a minha maquiagem. Enquanto eu recebia o
tratamento de figurante VIP, o resto do pessoal ficou esperando. Eles
iam usar as próprias roupas e atuar como o pessoal que estava na boate
“se divertindo”.
A cena era simples, os quatro protagonistas
conversavam animadamente sobre alguma coisa que jamais saberei. Pareciam
estar celebrando. Do nada, pára tudo e começa a música, os dançarinos
surgem mascarados. Fumaça, dancinhas sensuais e muita dublagem mal
feita. Se você me perguntar, até hoje eu sei cantar essa música, e não,
eu não falo nem “oi” em Punjabi.
Sim, Punjabi, e não Hindi. O nome do filme que
gravamos é “The Glory of Punjab” ou Saadi Wakhri Hain Shaana. Punjab é
um estado no noroeste do país, da qual Chandigarh
é a capital. E agora é a parte em que eu revelo a verdade: depois de
iniciada minha história venho a vocês falar que menti e não gravei
nenhum filme de Bollywood. Na verdade eu gravei um filme de Pollywood.
Porque na Índia, a indústria de cinema inspirada em Hollywood varia de
nome de acordo com a região e o idioma falado. No caso, Bollywood é a
maior indústria, que fica em Mumbai, que antigamente era chamada de
Bombaim.
Enfim, Polly ou Bolly, o que importa é que tanta
cantoria e dança renderam dois dias inteirinhos de gravação. Os atores
circulavam pelo cenário da boate enquanto eu ficava atrás do balcão do
bar jogando garrafas para o alto e fazendo altos passos de dança
extravagantes, tais como: a dança do siri, olha a onda, o clássico
claudinho e buchecha afundam no oceano, entre outros.
Enquanto isso, a continuidade mandava lembranças ao diretor, porque o
Rafa e a Naty e os outros figurantes mudavam de lugar toda vez que tinha
uma parada. Aliás, a Naty no primeiro dia gravou um cena que ela
falava: – Hello! para o protagonista, e no dia seguinte eles colocaram
outra roupa nela: lógica, cade você?
A experiência foi bem cansativa (veja nossas caras na foto acima), mas
obviamente divertida. Estranho foi descobrir, meses depois que tínhamos
gravado tudo e já de volta ao Brasil, que o filme – cuja a qualidade
duvidosa me fez não acreditar no seu real lançamento – de fato tinha
sido lançado. E vejam só, a cena que demorou cerca de 15 horas para ser
feita tem exato 1 minuto no filme. E eu desafio a quem conseguir me
achar no clipe. Ainda bem.
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